Blog do Cinema
Acompanhante Perfeita: amor que mata
Os laços de parentesco da comédia de ficção científica Acompanhante Perfeita (Companion, 2025) com outras produções permitem identificar relações temáticas próximas tanto com a série Black Mirror (criada em 2011) quanto com o filme Ex-Machina: Instinto Artificial (2014). Além disso, pela sua abordagem, o longa também dialoga com thrillers sociais como Corra! (2017) e Pisque Duas Vezes (2024). Dirigido pelo estreante Drew Hancock, o filme explora o exercício de satisfação dos desejos em uma sociedade altamente tecnológica. Embora o universo em que se insira seja repleto de promessas e possibilidades, Acompanhante Perfeita se apresenta, em essência, como uma especulação científica com foco no entretenimento, ainda que carregue, em seu subtexto, pretensões satíricas e críticas sociais.
O futuro retratado no filme apresenta um mundo onde androides extremamente realistas já fazem parte do cotidiano dos seres humanos. A trama de Acompanhante Perfeita concentra-se em um desses humanos, que desenvolve um relacionamento próximo, porém tóxico, com um desses seres cibernéticos. Como já nos alertou o supercomputador HAL 9000 no clássico 2001: Uma Odisseia no Espaço, a tecnologia, muitas vezes vista como infalível, pode falhar e transformar-se em tragédia anunciada.
Após se conhecerem em um mercado, Iris (Sophie Thatcher, do recente Herege) e Josh (Jack Quaid) se apaixonam rapidamente e assumem um relacionamento intenso. Vivem um romance perfeito, digno de conto de fadas, onde tudo parece ideal para dois apaixonados. Para celebrar um fim de semana especial, eles viajam com amigos para uma luxuosa casa de campo, em busca de descanso e diversão. No entanto, o que prometia ser um retiro tranquilo se transforma em um verdadeiro pesadelo quando uma revelação inesperada vem à tona: Iris, na verdade, é uma robô.
A descoberta desencadeia uma série de eventos perigosos que rapidamente fogem ao controle. A aparentemente doce Iris, na realidade uma máquina altamente sofisticada, é forçada a lutar por sua sobrevivência enquanto tenta compreender sua própria existência.
Aqui, não se trata de um spoiler revelar que a personagem central é uma máquina. Essa informação já estava presente nos trailers de divulgação de Acompanhante Perfeita. Portanto, a tal "grande revelação" não é exatamente o principal atrativo para causar espanto no espectador. O diretor aposta todas as suas fichas no suspense e na tensão que se desenvolvem ao longo da trama, sustentados por uma série de reviravoltas que surgem a cada dez minutos de ação. A alternância entre choque e pavor é a grande arma do filme, embora isso não seja necessariamente um mérito em si, nem tenha sido executado de maneira totalmente eficaz.
Na verdade, essa estrutura acaba trabalhando contra os propósitos do próprio filme, pois não abre espaço narrativo para uma reflexão mais profunda sobre seu suposto subtexto. No final, tudo acaba diluído, sobressaindo-se uma abordagem extremamente ampla em termos de gênero, que mistura comédia romântica, suspense, policial, terror e até elementos de paródia. É muita coisa para um único filme, e Acompanhante Perfeita definitivamente não consegue dar conta de tantas camadas.
No cerne do filme, está a discussão sobre os limites — possíveis ou necessários — entre humanos e máquinas. Uma questão tão complexa que nem mesmo a Inteligência Artificial consegue respondê-la de forma categórica ou definitiva, já que a resposta varia conforme o ponto de vista adotado. Acompanhante Perfeita, no entanto, não se propõe a resolver esse dilema. É uma sátira, do início ao fim, e não espere muito mais do que isso. O filme não pretende — e nem consegue — entregar respostas profundas ou conclusivas.
Encontrou algum erro? Informe aqui
O Judoka: em busca do filme perdido
Os 50 anos da pioneira adaptação de quadrinhos brasileira