Blog da Poesia

Poemas clássicos da literatura brasileira

29/01/2025 09:46 - por Tiago Vargas tiagovargas.uab@gmail.com

Sempre é difícil fazer listas definitivas ou taxar algo em simples classificações.  Listar os "poemas mais importantes" do Brasil pode ser subjetivo, pois a importância de um poema pode variar de acordo com critérios históricos, culturais, estéticos ou pessoais. No entanto, alguns poemas ganharam destaque na tradição literária tupiniquim e estes são frequentemente estudados e celebrados.

O blog da poesia desta edição traz alguns deles. 

Soneto da Fidelidade, Vinícius de Moraes
Uma das principais obras de Vinicius, o Soneto de Fidelidade é um dos preferidos dos corações apaixonados, é ou não é?

E o mais legal é que aqui, o poetinha Vinicius não promete aquele amor eterno, mas temos, sim, a promessa de que o amor será vivido em sua plenitude. O que acaba sendo mais intenso e proveitoso. Interpretações à parte, confira um trecho desse importante poema brasileiro:

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
(...)
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

No Meio do Caminho, Carlos Drummond de Andrade
Um dos mais famosos poemas brasileiros tem na simplicidade dos seus versos a riqueza de significados. Afinal, a poesia tem dessas coisas, uma frase pode significar mil coisas ou, também, ser bem direta.

O mineiro Carlos Drummond “chocou” a crítica especializada com um “poema repetitivo”, “simplório”. Mas que, até hoje, é referência literária, utilizado não só em textos, mas como também em outras artes, como charges e quadrinhos. Quem diria que uma simples pedra no caminho tornaria Drummond uma referência?
Este já foi explicado aqui mesmo em outra edição do blog. 

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas(...).

Canção do Exílio, Gonçalves Dias
Gonçalves Dias criou essa obra literária, embasada no patriotismo quando estava em Coimbra, como o nome da própria poesia sugere, em exílio. O poema é um marco do início do romantismo brasileiro.

É impossível negar tamanha importância desse poema, ainda mais quando outros poetas, como o próprio Drummond citado acima, Casimiro de Abreu e Oswald de Andrade parafrasearam Dias.

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores. (...)

Curiosidade: reparou que, em Canção do Exílio, há trechos do nosso hino? “Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida, (no teu seio) mais amores”.4

Vou-me embora pra Pasárgada, Manuel Bandeira
Sabe aquele momento em que tudo te desanima? Você não quer fazer nada, as coisas não estão tão boas e a única solução é pegar suas coisas e fugir? Foi em um momento desses que nasceu um dos mais importantes poemas brasileiros.

A primeira coisa que você precisa saber é que Pasárgada realmente existiu, não é um nenhum delírio lírico de Manuel Bandeira. Pasárgada foi a capital do Primeiro Império Persa. E segundo o poema é bem direto mesmo, num anseio de fugir do presente ruim que vivia, Bandeira brandou que desejaria fugir para bem longe:

Este também já foi explicado no blog. 

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente(...)

Poema Sujo, Ferreira Gullar
Ferreira Gullar que nos desculpe, mas é impossível postar a sua obra-prima por inteira, neste post. Poema Sujo é dos poemas brasileiros mais extensos, com mais de dois mil versos. 

Uma poesia tão enorme só poderia ser uma coisa autobiográfica, afinal, além de sentimentos, o que mais os poetas conhecem que não a si próprios? Mas Poema Sujo também é uma representação social e política dos anos 70, no Brasil.

(...) um bicho que o universo fabrica
e vem sonhando desde as entranhas
azul
era o gato
azul
era o galo
azul
o cavalo
azul
teu cu
tua gengiva igual a tua bocetinha
que parecia sorrir entre as folhas de
banana entre os cheiros de flor
e bosta de porco aberta como
uma boca do corpo
(não como a tua boca de palavras) como uma
entrada para
eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida (...)

Saber Viver, Cora Carolina
Cora Coralina foi uma poetisa que, infelizmente, nos deu o ar da graça com seus poemas quando já tinha seus 76 anos. Mas, talvez, por isso sentimos em sua poesia uma sabedoria de vida de quem soube viver e aprender.

Sua lírica simplista nos fazer sentir acolhido, como se ela sentasse ao nosso lado e tivesse aquela conversa de avó e netos, contando a importância de saber compartilhar e viver a vida de maneira simples, porém honesta.

Não sei…
se a vida é curta
ou longa demais para nós.
Mas sei que nada do que vivemos
tem sentido,
se não tocarmos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe,
braço que envolve,
palavra que conforta,
silêncio que respeita,
alegria que contagia,
lágrima que corre,
olhar que sacia,
amor que promove.
(...)

Retrato, Cecília Meireles
Cecília Meireles é, talvez, a escritora brasileira mais intimista que conhecemos. Suas obras trazem sempre aquela sensação de que ela se transforma nas personagens e cria uma narrativa bem realística, como quem conta o que está acontecendo naquele exato momento, mas vendo de fora.

Retrato é mais uma dessas obras autobiográficas, que trata do tempo, dos sentimentos antagônicos do passado e presente.

Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
— Em que espelho ficou perdida
a minha face?

O Tempo, Mário Quintana
Mário Quintana é um dos poetas mais populares da nossa literatura, graças às simplicidades dos seus versos. Com isso, sua mensagem chegava - e ainda chega - a um público maior, não necessariamente aficionados por poesias.

Em O tempo, Quintana traz uma reflexão sobre a passagem desse agente vital, daquilo que se aprende com as nossas experiências e o que perdemos com coisas supérfluas.

Uma curiosidade: o título original era Seiscentos e Sessenta e Seis, um número icônico, que representa o número do mal (ou da besta, como consta na bíblia). Apesar dessa referência, na verdade, o título representava os números contidos no poema e que registravam a passagem do tempo.

(...)
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6ª-feira…
Quando se vê, passaram 60 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre em frente…
(...)

Morte e Vida Severina, João Cabral de Melo Neto
Uma das mais importantes obras da literatura brasileira, é uma bela poesia regionalista. Na verdade, é um livro inteiro em forma de poema que retrata a vida indigna de um retirante nordestino, em busca de um mínimo de dignidade para sua vida.

Severino tornou-se um ícone da nossa literatura, um legítimo representante do nosso Nordeste e a obra de João Cabral é um marco modernista.

— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
(...)

Outros grandes poemas brasileiros
"Navio Negreiro" - Castro Alves: Uma vigorosa denúncia da escravidão, representativa da poesia social e abolicionista do poeta.

"Profissão de Fé" - Olavo Bilac: Exemplifica a busca pela perfeição formal e a beleza estética do Parnasianismo.

"Broquéis" - Cruz e Sousa: A obra inteira é considerada um marco do Simbolismo, com poemas que exploram temas espirituais e existenciais.

"Pauliceia Desvairada" - Mário de Andrade: Uma das obras-chave da poesia modernista brasileira, que rompe com as formas tradicionais.

"Os Sapos" - Manuel Bandeira: Famoso por ser recitado na Semana de Arte Moderna de 1922, é uma sátira ao parnasianismo.

"Poema de Sete Faces" - Carlos Drummond de Andrade: Do livro "Alguma Poesia", é um dos poemas mais emblemáticos do autor, revelando sua visão de mundo e estilo único.

"Plano-Piloto para Poesia Concreta" - Décio Pignatari, Haroldo e Augusto de Campos: Não é um único poema, mas um manifesto que define a poesia concreta.

"A Máquina do Mundo" - Carlos Drummond de Andrade: Embora Drummond não seja um poeta marginal, este poema é contemporâneo ao movimento, sendo considerado um dos seus mais complexos e profundos.

"Com Licença Poética" - Adélia Prado: Este poema reflete a essência da poesia de Prado, que combina o cotidiano com uma profunda espiritualidade.

Considerações sobre os poemas brasileiros
A poesia brasileira é um vasto oceano de expressividade, diversidade e riqueza cultural. Ela reflete as várias faces do Brasil: suas lutas históricas, suas paisagens deslumbrantes, sua complexidade social e suas inúmeras identidades. Desde os versos saudosos do Romantismo que evocavam a exuberância da terra e a dor do exílio, passando pela precisão técnica do Parnasianismo e pela introspecção do Simbolismo, até o revolucionário Modernismo que redefiniu a linguagem poética e celebrou o espírito brasileiro em todas as suas formas.

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