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Vou-me embora pra Pasárgada, de Manuel Bandeira

16/10/2024 08:39 - por Tiago Vargas tiagovargas.uab@gmail.com

Quem é que um dia não teve vontade de mandar tudo para o espaço e fazer as malas rumo à Pasárgada? O poema lançado em 1930 fala diretamente a cada um de nós que, um belo dia, diante de um aperto, teve vontade de desistir e partir em direção à um lugar distante e idealizado.

Mas afinal, você sabe onde fica Pasárgada? 

A cidade não é inventada, ela de fato existiu e foi a capital do Primeiro Império Persa. É pra lá que o sujeito poético pretende escapar quando a realidade presente o sufoca.

O poema de Bandeira, publicado no livro Libertinagem é marcado, portanto, por um desejo de escapismo, ansiando alcançar liberdade e descanso em um lugar onde tudo funciona em plena harmonia, pelo menos no campo da imaginação.

 O poema modernista foi escrito e construído com redondilhas, que remete a ideia do já mencionado escapismo, muito comum em poemas arcadistas e românticos, que buscavam sempre uma forma de aliviar a dor do amor não correspondido ou uma inspiração em lugares distantes e campestres. 

No poema o escapismo e a fuga denotam ideia de liberdade e o desejo de viver uma vida ativa que a doença acometida o privou de ter. Em vários momentos da obra, é possível identificar um retorno à infância antes da enfermidade se instalar. 

É perceptível também temas como o afeto e o contato físico, temas sensíveis para Manuel Bandeira. 

A fuga para Pasárgada também traria a possibilidade de viver aventuras amorosas e a satisfação dos desejos eróticos em um lugar onde não existe solidão e onde tudo é possível, sem as amarras da vida real.

Desse modo, Pasárgada transcendeu a própria poesia e se tornou a representação de um lugar onde a vida é melhor, um símbolo de liberdade e hedonismo, que prega o prazer como estilo de vida. 

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água.
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

 

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