Blog da Poesia

Diego Grando

07/04/2021 08:20

Diego Grando nasceu em Porto Alegre em 1981. Professor de literatura na PUC e Doutor em Letras pela UFGRS. Publicou os livros “Desencantado carrossel’’, “Sétima do singular’’, “25 A rua do templo/Palavras de Paris’’ e “Spoilers’’. Grando é integrante também do tradicional Sarau Elétrico, com apresentações regulares nas terças-feiras no Bar Ocidente, na capital gaúcha.

A força literária de Grando reside nos fatos comuns, poesia singular que surge nos nomes, lugares, crenças, amores e cheiros cotidianos. Seu lirismo resgata de forma peculiar fragmentos da memória. Consegue filtrar com olhar interrogativo nuances sobre objetos e a própria existência como se fosse um caleidoscópio inusual. Em outras palavras... esmiúça a vida/tempo com perspicaz propriedade semântica retratando imagens com fruição de sentidos incomum. Poesia experimental, inteligente. Com frescor da originalidade.

m alguma ville du Sud
Procuro alguém para dividir um silêncio
que é só meu
É preciso ser capaz
de ouvir o nada
e também a barulho da lágrima seca
do bolso vazio
do postal em branco
Não havendo candidato
peço (en)carecido uma palavra
qualquer
um tapinha nas costas
um sorriso mesmo que amarelo
Não sendo pedir demais
uma indicação
do próximo trem
(e algum bom analgésico)
a tomar
Diego Grando

Década (obsolescência programada)
Não tenho culpa se nasci dez anos antes
se conheço a estrada
(e sei que só leva
a nada):
dez anos, uma decadência
em cento e vinte parcelas mensais.

Dez anos é coisa demais
demais em qualquer
bagagem
(qual-quer, eu disse,
com hífen nos dentes)
dos trechos riscados nos livros
aos riscos cifrados nos trechos.

Veneno para simpatia
(antídoto de afinidades)
dez anos, um muito de gente
por vir ou perdida
pendente: in-
decênio que nunca termina
de escavar nossa distância.
Diego Grando

manifesto
de ser rançoso de hoje em diante deixo
e assumo o risco de fazer deboche.
pior que a própria culpa e o reproche
é ver correrem frases como seixos
rolados pelo leito caudaloso
de um rio antiverbal, grandiloquoso.
a gozador eu passo desde agora;
algumas marcas fiquem, muito embora.
(como esse último verso ainda se inverte
enquanto que este aparte já anuncia
discórdia pa(ren)tética e inerte:
ao som de uma nova cacofonia
o uso de minúsculas subverte
e eis-me a torturar com anestesia).
Diego Grando

CATACUMBAS
Morcegos velhos revirando catacumbas.
Povo doente, trabalhando até a morte.
Importa pouco o povo.
Mais vale um corvo.
No meio do lodo doloso.
Brasília em sua forma de avião.
E cai o Bobo da bananeira.
Será que ele nunca existiu?
Brasil, é um coração
Batendo mais fraco.
Milhares já pararam de bater.
Vamos levantar a cabeça, derrubar
Déspotas esclarecidos, debater.
Se preciso renascer...
Eu ainda acredito no poder do amor,
Do respeito ao próximo,
No valor da vida.
No hoje e no amanhã.
Em um prato justo e limpo de comida.
Creio na ciência e na vacina.
No poder do estudo, na lida de campo.
Na Educação como transformação.
E se as covas forem coletivas?
Ao menos lutei pelo humano
Que ainda existe em mim.
Bedermino Betat Leite

Venha me ter
Na ponta dos dedos
Bem delicado
Em ato contínuo
Como o tato
Para o braille .
Gerson Nagel

Sutil
Encanta-me o simples
A sutil delicadeza da essência
O que canta é a alma
Não o ego.
Tatiana Linhares

Tecido poético
Quando as palavras
tecem metáforas
e solfejam
singulares ideias
surge
a vertigem
infinita do poema.
Isabel Furini

Escrever é resistir
Onde poucos leem
Nestes tempos imprecisos
Por que escrever
Por que usar os velhos signos
Se há tantos indignos
Que não se prestam a ler
Nossa voz se perde
Milhares de vozes sucedem
E já não se escuta ninguém
Passou o tempo da escrita
A imagem agora é a bendita
E tudo se deseja ver
A velocidade aniquila a beleza
Internet de todas tristezas
Escrever é o oficio da dor.
Bagual Silvestris

Sombras da Guerra
Egos frágeis
Colocaram muitos a lutar
Por uma causa
Que não lhes cabiam opinar
Postos em combate
Com um objetivo em mente
Atacar sem piedade
O outro humano em sua frente
Apertar o gatilho
Atirar para viver
Na linha de frente
Quem iria sobreviver?
Na terra de ninguém
A paz parecia ocorrer
Antes do ataque
De novo proceder
Atirar para se defender
Foi o que todos tentaram fazer
Enquanto os egos
Apreciavam seu poder
Pessoas comuns
Lutaram para defender
Os ideais de alguns
Que não queriam se resolver
Com vidas
Para trás deixadas
Perdidas em combate
Por falta de debate
Que isso sirva de exemplo!
Para não ouvirmos outra vez falar...
Que por baixo do véu da guerra
“A cobra vai fumar”1
1 Referência ao ditado falado quando o Brasil foi para a Segunda Guerra Mundial.
Constelação F.

Ritual
Tempo de seguir
O ritual das lavadeiras:
Alvejar a alma,
Banhar sonhos no rio,
Quarar memórias ao sol
E deixar desejos ao vento.
Marion Cruz

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