Blog da Poesia

Hilda Machado

17/04/2019 09:37

Hilda Machado foi uma poetisa, professora e cineasta. Morreu em setembro de 2007 aos 56 anos. Reservada não costumava compartilhar seus escritos. Em vida publicou somente dois poemas, ambos na revista Inimigo Rumor. No entanto, deixou registrado na Biblioteca Nacional para um publicação póstuma um manuscrito com título, epígrafe e índice. Nas nuvens é o nome do livro. São 24 poemas que vêm ao público graças a devoção do também poeta Ricardo Domeneck, arrebatado a partir da leitura de Miscasting, poema antideslumbramento e de um lirismo diferenciado. Os escritos de Hilda são uma espécie de resquícios de Gregório de Matos e Baudelaire. Poesia que se caracterizou pela densidade, originalidade, por um sofrimento raivoso e de um cinismo e sarcasmo latente.

Por: Tiago Vargas

 

Parar
De fazer mil coisas ao mesmo tempo
De bater de encontro às coisas
De encontrar elefantes dentro das lojas.
Sou de porcelana.
Hilda Machado




UM HOMEM NO CHÃO DA MINHA SALA

Um homem no chão da minha sala alonga sua raiz galo que estufa o pescoço cana-de-açúcar e bronze poças, chuva, telha-vã rio que escorre na velha taça empoeirada O homem no chão da minha sala cidades de ouro castelos de mel velhas metáforas sinos línguas gelatina O céu no chão da minha sala Esse homem no chão da minha sala provoca o veneno da cobra pulgas atrás das orelhas mexeu nos meus bibelôs consertou aquela estante revirou a roupa suja desenterrou flores secas fraldas chifres quatro cascas de ferida um disco todo arranhado e um punhado de pelos Aquele homem no chão daquela sala me fez cruzar o ribeirão dos mudos estufa de tinhorões gigantes no piso do meu mármore ele acordou a doida as quatro damas do baralho uma ninfeta de barro e a cadela do vizinho Daquele homem no chão da minha sala há meses não tenho notícia desde que virei a cara saltei janela fugi sem freio ladeira abaixo perdi o bonde estraguei tudo

Hilda Machado

 

Rio

Ei, você, estranho miserável!
Você que me julga por preconceito.
Que tipo de normal és?
Saiba: suas palavras são miseráveis.
E eu, este louco, rio,
Rio, rio, rio...
Deságuo em gargalhadas na tua insensatez mesquinha.
Honrado imbecil!
Sim, eu te estranho com essa roupa sem rasgos e sem manchas.
Sim, eu te estranho com tua pouca propriedade, com tua pouca dignidade.
Eu te estranho, pobre desgraçado!
Estranho essa falta de personalidade, essa falta de amor próprio;
Estranho essas caras, esses olhares, esses trejeitos copiados.
E por tudo isso eu rio quando te vejo,
Rio em silêncio,
Rio quando falo, canto, danço, ando, corro, jogo, pulo...
Rio também quando te vejo caminhando a minha frente.
Ridículo! Eu penso.
Me desculpe, mas eu rio.
Da tua permanência,
De tudo o que te pertence.
Rio.

Bryan Chagas

 

Vi a beleza

Eu vi a beleza
E ela estava nua
Olhava para mim
Com sua leveza
Um olhar de jardim
Florido, colorido
Em um doce retrato
Cinza, preto e branco

Eu vi a beleza
E ela era tão pura
Delicada como pétala
Forte como o desejo
Com perfume de céu
Sobrevoando o sonho
Se deliciando de flor
E da penumbra do amor

Eu vi a beleza
E ela era a minha lua
Cortando a noite
Em duas metades
Uma parte santa
A outra parte luta
E está melhor parte
Pairava em meu céu

Eu vi a beleza
E ela era minha musa
Tocava em meu peito
A sua doce melodia
Cantando meu nome
Como uma poesia
No delírio da escuridão

Eu vi a beleza
E ela estava nua
Entregava para mim
Todos os seus segredos
E despida de medos
Entregou o seu amor
E com meu amor se vestiu

Edison Botelho

 

Passou
E quando a dor não dói mais?
Vira jardim
Floresce em flor,
Sem cor,
Sem amor.

Tatiane Linhares

 

abraço

o tempo de um abraço
é sagrado

abraço não dado
no tempo do querer
no desejo de ser
deixa oco por dentro

abraço não dado
dói todos os dias
em todos os lugares
em todas as pessoas

é o cansaço dos braços
que seguem abertos

sem o abraço
sobra espaço
dos braços do outro
que jamais será ocupado

no entanto
é possível
reencontrar aqueles braços
e abraçar a própria dor

Marion Cruz

 

A PARTIDA

Antes de partir,
percorreu todas as estradas
do corpo, da alma
e do coração.
Escancarou janelas
abriu portões,
revirou tudo que havia
escondido dentro de mim.
Jogou fogo nas lembranças
e arrastou pelo mundo
a esperança que morava aqui.

Neicla Bernardes

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