Estamos em 2021, época em que assuntos polêmicos não são mais tabus, graças à TV e ao cinema. Incesto já foi bastante explorado em uma famosa série com dragões. Predadores sexuais que usam a internet para seduzir crianças já foi assunto de novela das nove. Transexualidade, cleptomania, transtornos mentais e outros tantos assuntos que eram impossíveis de se conversar em família, hoje estão ao acesso de qualquer um que tenha um aparelho conectado à internet. Agora, imagina esses mesmos assuntos serem abordados em plena década de 1970!

É exatamente em 1975 que se passa a ação de Tio Frank, filme original da Amazon Prime Video que estreou em janeiro. Nessa época, homossexualidade era ‘homossexualismo’, com o sufixo ‘ismo’, indicando que era uma doença. Ser gay antes te dava várias opções, e nenhuma era boa: casar contra a vontade com uma mulher, esconder seus sentimentos, mostrar seus sentimentos e ser espancado e humilhado pela família, ser ameaçado de morte, suicídio, ou fugir sem nada para outro lugar, para alívio da família.

Claro, que em pleno 2021, algumas dessas coisas acontecem, mas não vamos focar nessas pessoas que não conseguem usar o mínimo de seu cérebro para entender as diferenças. Desses eu passo longe, porque é inútil discutir com quem não entende do assunto.

O Filme
A primeira coisa em Tio Frank que me chamou a atenção foi a semelhança com o vencedor do Oscar de Melhor Filme, Green Book – O Guia. Ambos são road-movies (filme sobre viagem, onde a maior parte da ação se passa na estrada) cujo tema central é a homossexualidade dos personagens. Beth é uma jovem de 18 anos que sempre admirou seu tio Frank, os dois tinham assuntos em comum e desde pequena ela adorava estar na companhia do tio, que vinha de Nova Iorque em poucas ocasiões visitar a família em Creekville, na Carolina Do Sul.

Após os 18 anos, Beth vai estudar em Nova Iorque e acaba encontrando o tio, e surpreendentemente descobre que ele vive há mais de dez anos um relacionamento com o árabe Wally, um cara super otimista que está sempre sorrindo. Frank e Wally se amam e isso não resta dúvida. Os três ficam inseparáveis, até que um dia Frank recebe um telefonema: seu pai acabara de falecer. Seu pai Mac soube que o filho era gay ao flagrar ele e o amigo Samuel, aos 16 anos, em uma cama. Após um sermão religioso, Mac ameaçou matar os dois se eles se encontrassem novamente. Para sua segurança, o jovem Frank termina com Samuel, e isso nunca mais saiu da cabeça de Frank, o que o levou a ter problemas com a bebida.

O Velório
Durante a ida ao velório, Wally os acompanha com a condição de ficar no hotel, longe da família de Frank. Wally também tem problemas com os familiares na Arábia: ninguém sabe de sua orientação sexual e ainda sonham em vê-lo casado.

Wally fugiu da Arábia, pois sabia que se ficasse lá, seria degolado ou enforcado, já que homossexuais eram condenados à morte na época. Apenas Beth e uma irmã de Frank sabem de sua sexualidade agora, e ambas não se importam. Até que durante a leitura do testamento, no dia do velório, o pai deixa uma mensagem para Frank e todos ficam sabendo de sua condição. Assustado e pego de surpresa, Frank foge e todo o medo de sua juventude volta à tona.

Lembranças de Samuel e de uma tragédia do passado fazem com que ele volte a beber e desapareça. Beth e Wally partem a sua procura e esperam ajudar Frank a fazer as pazes com seu passado, consigo mesmo e com Wally, a quem descarregou suas frustrações antes de sumir.

Você Precisa Saber:
>> Na Arábia Saudita, ser homossexual ainda é considerado crime, sendo as penas de: execução, mutilações genitais ou passar o resto da vida numa cela. Nada é permitido! Qualquer coisa fora dos padrões masculinos é motivo de dúvida e não há uma lei que os defenda. Se você quiser matar seu filho por ele ser gay, pode fazer isso em público que sairá impune ou talvez até com honras.

>> O suicídio entre jovens LGBT vem aumentando a cada ano, e a chance de um jovem gay se matar é 50% maior do que um jovem heterossexual. A maioria dos casos de suicídios são por conta da família não aceitar ou expulsar o jovem de casa. Quase 70% dos jovens entrevistados confessaram já sentir vontade de morrer ou tentar se matar. A chance de depressão entre a comunidade LGBT também é maior, por isso os altos índices de suicídios. Outro fato alarmante é que esses jovens estão se matando cada vez mais cedo (casos de crianças de 11 e 12 anos por exemplo), justamente por não terem maturidade suficiente para lidar com sua própria condição e ainda depender inteiramente dos pais. O bullying é outro fator crucial na causa de suicídios entre estudantes. Falei desse tema porque ele é brevemente citado no filme, em um dos momentos mais comoventes da história!

Finalizando
Tio Frank não traz nada de novo aos dramas familiares: personagens excêntricos, casais em conflito, segredos revelados, todo tipo de coisa que acontece em reuniões familiares nos filmes. Mas o que levou o diretor a ganhar vários prêmios em festivais em 2020 foi a sutileza em que a história é contada. Não há apelação, gays são retratados como pessoas normais que são, e não como seres escandalosos como vemos nas telenovelas ou comédias pastelão. Sem falar que Paul Bettany (o Visão do Universo Marvel), dá um show de interpretação, assim como a jovem Sophia Lillis (de IT – A Coisa).

Assistir Tio Frank dá uma pontada no peito ao ver como era difícil amar alguém do mesmo sexo, mas ao mesmo tempo dá uma nostalgia, pois amar significava AMAR mesmo. Era uma época onde ter um amor duradouro e verdadeiro era muito melhor do que ter dez transas fáceis num fim de semana como na época atual. Que um dia o amor volte a entrar na moda, sem brigas familiares, sem expulsões, sem mágoas, apenas duas pessoas construindo juntos um futuro.

Se gostar e quiser bater um papo sobre o filme no meu grupo Cine Clube Patrick no Facebook (https://www.facebook.com/groups/221933446146985), ou na página O Mundo Anda Muito Louco (https://www.facebook.com/patrickprade666) esteja à vontade, pois farei uma postagem sobre o filme. Até semana que vem e bons filmes!

Trailer legendado: https://youtu.be/IbDE1r0wHIg